Além do fetiche amazônico

Autores

  • Helena Marroig Barreto UFRJ

Palavras-chave:

fetichismo da natureza, Amazônia, neoliberalismo

Resumo

Este artigo investiga criticamente as representações hegemônicas da
Amazônia, analisando como narrativas fetichizadas constroem a região
como um espaço abstrato e funcional à lógica da acumulação capitalista.
Argumenta-se que tais imagens apagam a complexidade socioecológica
amazônica, reduzindo-a a dinâmicas mercantis, processo intensificado
sob o neoliberalismo por meio do discurso de sustentabilidade. A partir
do conceito de fetichismo da mercadoria, o texto examina como a Amazônia
é permanentemente reimaginada por interesses do capital, desde
mitos coloniais até visões contemporâneas que a apresentam como “última
fronteira”. O artigo propõe que essas representações não são simples
falseamentos, mas relações de poder que organizam a sociabilidade e
cristalizam a dominação capitalista sobre o território. Por fim, discute-se
como a mercantilização contemporânea da natureza, sobretudo através
do paradigma de serviços ecossistêmicos, se organiza na região. Pondera-
se que no neoliberalismo, o ambientalismo se torna um vetor de
apropriação da natureza, internalizando e neutralizando lutas ecológicas.
Isso aprofunda a reificação da Amazônia e amplia os processos de
dominação e acumulação, ao mesmo tempo que apaga modos de vida
alternativos e a diversidade concreta da região.

Referências

BAKKER, Karen J. An uncooperative commodity: Privatizing water in England and Wales. Oxford

University Press, 2004.

BATISTA, IMSA. A “Natureza” amazônica: dos mitos edênicos à reserva de capital natural. Simpósio

Nacional de História, v. 27, 2013.

BECKER, Bertha K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Editora Garamond, 2004.

BIELSCHOWSKY, Ricardo; MUSSI, Carlos (Orgs.).O pensamento desenvolvimentista no Brasil:

-1964 e anotações sobre 1964-2005. Seminário Brasil-Chile: Una Mirada Hacia América latina y

sus Perspectivas. Santiago, jul. 2005.

BIGGER, Patrick; DEMPSEY, Jessica. The Ins and Outs of Neoliberal Nature. Environment and Society,

v. 9, n. 1, p. 25-40, 2018.

BÜSCHER, Bram et al. Towards a synthesized critique of neoliberal biodiversity conservation.

Capitalism Nature Socialism, v. 23, n. 2, p. 4-30, 2012.

CAMELY, Nazira Correia. A geopolítica do ambientalismo ongueiro na Amazônia brasileira: um estudo

sobre o estado do Acre. UFF (tese de doutorado em geografia) 2009.

CARCANHOLO, Reinaldo. Capital: essência e aparência. São Paulo: Expressão Popular, v. 1, p. 211-

, 2011.

CASSEGÅRD, Carl. Eco-Marxism and the critical theory of nature: two perspectives on ecology and

dialectics. Distinktion: Journal of social theory, v. 18, n. 3, p. 314-332, 2017.

CASTREE, Noel. Making Sense of Nature. London: Routledge. 2013.

CLEMENT, Charles R. et al. The domestication of Amazonia before European conquest. Proceedings

of the Royal Society B: Biological Sciences, v. 282, n. 1812, p. 20150813, 2015.

COLOMBINI, Iderley. Oil and Financialization: Another Relation. International Critical Thought, v. 11,

n. 2, p. 232-251, 2021.

CONSTANZA, Robert et al. The value of the world’s ecosystem services and natural capital. Nature,

v. 387, p. 253-260, 1997.

CRUZ, Benedito Ely Valente da; LIRA, Andréia dos Santos. Amazônia na Encruzilhada: Fronteira de

recursos ou capital natural: que caminho seguir? Revista GeoAmazônia, v. 13, n. 25, p. 423-437.

DE ANGELIS, Massimo. Marx and primitive accumulation: The continuous character of capital’s

“enclosures”. The commoner, v. 2, n. 1, p. 1-22, 2001.

DEMPSEY, Jessica; ROBERTSON, Morgan M. Ecosystem services: Tensions, impurities, and points of

engagement within neoliberalism. Progress in human geography, v. 36, n. 6, p. 758-779, 2012.

FELLI, Romain. Environment, not planning: the neoliberal depoliticisation of environmental policy by

means of emissions trading. Environmental Politics, v. 24, n. 5, p. 641-660, 2015.

FURTADO, Fabrina. A construção da natureza e a natureza da construção: políticas de incentivo aos

serviços ambientais no Acre e no Mato Grosso. Estudos Sociedade e Agricultura, v. 26, n. 1, p. 123-147,

GOMEZ-BAGGETHUN, Erik; et al. The history of ecosystem services in economic theory and

practice. Ecological Economics, v. 69, n. 6, p. 1209-1218, 2010.

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia: encruzilhada civilizatória: tensões territoriais em curso.

[S. l.]: Consequência, 2017.

GRAEBER, David; WENGROW, David. The dawn of everything: A new history of humanity. Penguin UK,

GRESPAN, Jorge. Marx e a crítica do modo de representação capitalista. São Paulo: Boitempo Editorial,

HIRSCH, Joachim. Fordism and Post-Fordism. Capital & Class, v. 15, n. 2, p. 119-138, 1991.

HUBER, M. T. Oil, Life, and the Fetishism of Geopolitics. Capitalism Nature Socialism 22 (3): 32–48,

LOHMANN, Larry. Neoliberalism and the calculable world: The rise of carbon trading. In: Kean

Birch and Vlad Mykhnenko, The rise and fall of neoliberalism: The collapse of an economic order? Londres:

Zed books, 2010.

MANSFIELD, Becky. Rules of privatization: contradictions in neoliberal regulation of North Pacific

fisheries. Annals of the Association of American Geographers, v. 94, n. 3, p. 565-584, 2004.

MARQUES, Gilberto de Souza et al. Estado e desenvolvimento na Amazônia: a inclusão amazônica

na reprodução capitalista brasileira. Tese (Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento,

Agricultura e Sociedade). UFRRJ. Seropédica, 2007.

MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. 4ª ed. Tradução de Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo

Editorial, 2010.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política (Livro 1) [1867]. Tradução de Rubens Enderle. São

Paulo: Boitempo, 2013.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política (Livro 2) [1884]. Tradução de Rubens Enderle. São

Paulo: Boitempo, 2014.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política (Livro 3) [1894]. Tradução de Rubens Enderle. São

Paulo: Boitempo, 2017.

MCAFEE, Kathleen. Neoliberalism on the molecular scale. Economic and genetic reductionism in

biotechnology battles. Geoforum, v. 34, n. 2, p. 203-219, 2003.

MITCHELL, Timothy. The resources of economics: making the 1973 oil crisis. Journal of Cultural

Economy, v. 3, n. 2, p. 189-204, 2010.

MOORE, Jason W. Capitalism in the Web of Life: Ecology and the Accumulation of Capital. Verso Books, 2015.

NELSON, Sara Holiday. Neoliberal environments: Crisis, counterrevolution, and the nature of value. Tese

(Doutorado em geografia). University of Minnesota, 2017

PRADO JUNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. 43a. ed. São Paulo: Brasiliense, 1998.

RECH, Lucas; BARRETO, Helena; SILVA, Cintia Riquele. François Quesnay na Teia da Vida: um

apontamento preliminar dos problemas teóricos na obra de Jason Moore. In: Anais do XXIX Encontro

Nacional de Economia Política, Marabá. SEP, 2024.

ROBERTSON, M. No net loss: wetland restoration and the incomplete capitalization of nature.

Antipode, v. 32, n. 4, p. 463-493, 2000.

ROBERTSON, M. Flexible nature: Governing with the environment in the development of US

neoliberalism. Annals of the American Association of Geographers, v. 108, n. 6, p. 1601-1619, 2018.

RODNEY, W. Como a Europa subdesenvolveu a África? Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo:

Boitempo, 2022

SAES, Beatriz Macchione; ROMEIRO, Ademar Ribeiro. O debate metodológico na economia

ecológica: indefinição ou pluralismo? Nova Economia, v. 28, p. 127-153, 2018.

SMITH, Neil. Nature as accumulation strategy. Socialist Register, v. 43, 2007.

TRINDADE, José Raimundo Barreto; FERRAZ, Lucas Paiva. Acumulação por espoliação e atividade

agropecuária na Amazônia brasileira. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, n. 67,

p. 43-77, 2023.

Downloads

Publicado

05.09.2025